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sábado, 31 de março de 2012

Banco do Brasil, CEF e a festa no TRF




 
Saiu na Folha de hoje (28/3/12):

Bancos oficiais pagam coquetel para juízes em São Paulo
A Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil pagarão as despesas de um evento festivo do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (SP e MS) na segunda-feira, no Theatro Municipal de São Paulo. A CEF desembolsará R$ 150 mil e o BB, R$ 75 mil.
O tribunal oferecerá recepção e coquetel para comemorar a posse de seus novos dirigentes, os juízes Newton De Lucca (presidente), Salette Nascimento (vice) e Fábio Prieto (corregedor).
Eles tomaram posse oficialmente em 17 de fevereiro no TRF, na presença de representantes do Legislativo, do Executivo, do Ministério Público e da OAB. O tribunal alega que a posse se deu na véspera do Carnaval e decidiu fazer a comemoração agora em local mais amplo, ‘sem dispêndio de recursos públicos’


A última declaração acima mostra uma confusão sobre onde se encaixam a Caixa e o Banco do Brasil.

A Caixa Econômica Federal é uma empresa pública, ainda que muita gente pense nela como sendo uma empresa privada comum, como qualquer outro banco. Não é. Do ponto de vista jurídico, ela é a mesma coisa que a Casa da Moeda, o Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados) e a Emgea (Empresa Gestora de Ativos): todos eles são empresas públicas ligadas ao Ministério da Fazenda.

Seria estranho dizer que a Casa da Moeda doou dinheiro para uma festa e, ao mesmo tempo, dizer que essa doação não foi de dinheiro público, certo? O mesmo ocorre com a Caixa Econômica Federal.
As empresas públicas são ligadas, e não subordinadas diretamente ao governo. Isso porque elas fazem parte da administração pública indireta, ou seja, possuem um maior grau de autonomia funcional do que os órgãos subordinados diretamente ao governo (como a Receita Federal, por exemplo). Mas o fato de fazer parte da administração pública indireta não quer dizer que não haja recursos públicos envolvidos. Pelo contrário: uma das principais características das empresas públicas é que a totalidade de seu capital social pertence ao governo.

Logo, na matéria acima, os R$150 mil podem até não ter sido pagos pelo TRF, mas foram pagos pelo governo federal: continuam sendo recursos públicos.

Já o Banco do Brasil é uma empresa de economia mista. Como as empresas públicas, as empresas de economia mista também fazem parte da administração pública indireta. A diferença é que nas empresas de economia mista a maior parte das ações com direito a voto pertencem ao governo, e não sua totalidade. É por isso que é possível comprar ações do Banco do Brasil, mas não da Caixa Econômica Federal.

Do ponto de vista jurídico, o Banco do Brasil está na mesma categoria do Banco da Amazônia (Basa), do Banco do Nordeste do Brasil (BNB), e do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB): são todos empresas de economia mista ligadas ao Ministério da Fazenda.

No caso do Banco do Brasil, cerca de 59,2% do capital pertence à União e outros 10,4% à Previ (a previdência dos servidores do Banco, que recebe dinheiro do Banco). Logo, os R$75 mil doados pelo Banco na matéria acima podem até não terem saído dos cofres do TRF, mas foram, em boa parte (ao menos R$44,4 mil) financiados por recursos públicos, já que que o governo é o maior dono do Banco.



Existe mais um detalhe. O título da matéria diz 'bancos'. A Caixa não é um banco. Ela é, o nome já diz, uma caixa econômica. A diferença é sutil, mas importante: ambos visam dar lucro (ninguém constitui uma empresa para dar prejuízo), mas as caixas econômicas têm, ao mesmo tempo, objetivos sociais importantes, tentando possibilitar o acesso a recursos financeiros de pessoas que, de outra forma, estariam excluídas. É por isso que ela financia programas habitacionais e abre conta corrente para clients que não seriam aceitos por bancos convencionais. Ela também gerencia fundos de cunho social, como o Cofins, PIS e seguro-desemprego.
 
Fonte:http://direito.folha.com.br/blog.html

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

“Judiciário é pouco honesto para 67% da população, diz FGV

Saiu no Valor Econômico do último dia 07/02/12:

Judiciário é pouco honesto para 67% da população, diz FGV
Duas em cada três pessoas consideram o Judiciário pouco ou nada honesto e sem independência. Mais da metade da população (55%) questiona a competência desse Poder. A má avaliação do Judiciário como prestador de serviço piorou ainda mais ao longo dos últimos três anos segundo pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (...)
Ao comparar a confiança no Judiciário com outras instituições, a pesquisa mostra esse Poder atrás das Forças Armadas, da Igreja Católica, do Ministério Público, das grandes empresas e da imprensa escrita. Na sexta colocação, o Judiciário aparece como mais confiável do que a polícia, o governo federal, as emissoras de TV, o Congresso e os partidos políticos.


Quando ouvimos falar que alguns juízes são contra os poderes do CNJ, nossa primeira impressão é que eles têm medo da transparência ou têm ‘rabos presos’. Alguns realmente são contra porque fizeram algo errado, mas outros são contra porque têm medo de perderem sua independência.

Durante a maior parte da história humana (pense nos faraós ou nos imperadores romanos, por exemplo), a vontade do líder era a única vontade válida. E os juízes serviam para julgar de acordo com a vontade dos soberanos. Se a vontade do subalterno se opunha à do líder, ele tinha três opções: tentar tomar o poder do rei, fugir ou mudar de opinião.

Essas, obviamente, não são soluções eficientes do ponto de vista social e econômico porque nem sempre o líder está certo e essas três opções privam o resto da sociedade de um mecanismo de correção.

No século 17 a Inglaterra encontrou uma primeira solução (copiando algo que existiu por um breve período em algumas cidades gregas milênios antes): dar o poder a um grupo maior: a vontade válida era a vontade do Parlamento, e não a do rei. Entre 1642 e 1649, a Inglaterra passou por duas guerras civis entre o Parlamento e o rei Charles II. Ele perdeu ambas e no final da segunda acabou decapitado. O poder passou a ser exercido soberanamente pelo Parlamento.

Mas as coisas não deram certo. Durante a década seguinte (1649-1660) o país tentou ser uma república, mas acabou descobrindo que o simples fato de ser uma república não garante prosperidade e muito menos democracia. O resultado foi que voltaram a ser uma monarquia e mergulharam em uma nova guerra civil em 1688 (Revolução Gloriosa), que terminou com um novo rei, mas desprovido de qualquer poder. A solução – que até hoje está parcialmente em vigor – dizia que o Parlamento era supremo, e exerceria tanto o papel de Legislativo quanto o de Executivo (gabinete do primeiro ministro), e o órgão máximo do Judiciário também seria do Parlamento (os Lordes da Justiça existiram até Dezembro de 2009).

O francês Montesquieu, estudando os acontecimentos na Inglaterra, percebeu que o sistema inglês apenas transferiu o poder absoluto de um Poder (Executivo) para outro (Legislativo). O problema, segundo ele, não era onde estava o poder absoluto, mas que sempre havia uma concentração de poder nas mãos de uma única instituição. A democracia seria muito mais forte se, em vez de concentrar o poder em uma instituição, os três poderes – Judiciário, Executivo e Legislativo – fossem repartidos e se controlassem.

Hoje essa ideia pode parecer lugar comum, mas para a época representava uma mudança enorme. O Judiciário já não julgaria – como fazia (e às vezes ainda faz) na Inglaterra – baseado no que o juiz considera justo (equidade), mas no que as leis determinam.

Foi esse modelo de tripartição de poderes que o Brasil implantou. Mas nem sempre com sucesso.

No golpe de 1964, o Executivo impôs o Ato Institucional 1, que suspendeu as garantias constitucionais e legais da vitaliciedade e estabilidade dos magistrados, que servem para garantir a independência e a imparcialidade dos juízes.

Essas medidas duraram quase duas décadas (até 1977), quando foram substituídas por outras (o chamado Pacote de Abril), que previam a criação do Conselho Nacional da Magistratura para fiscalizar a conduta dos juízes e a atribuição de competência para o Supremo Tribunal Federal para interpretar as leis em abstrato, vinculando a decisão de todos os demais juízes a essa interpretação. Essas novas medidas duraram até 1988.


Desde 1988, depois dos traumas da ditadura, o Judiciário tentou se manter isolado de qualquer influência externa. E isso inclui controle externo. 

Como qualquer outra instituição com poder, o Judiciário tem pessoas corruptas, despreparadas, etc. Mas há setores dentro do Judiciário que não são nem um nem outro e que ainda assim são contra o controle externo porque da última vez que tiveram tal controle, ele não funcionou. A implantação do controle pelo CNJ é uma grande mudança cultural, e essas são sempre as que sofrem maior resistência.

O problema é que nós, do lado de fora, não temos como saber quem é contra por questões culturais, e quem é contra porque tem o rabo preso.
Fonte:  http://direito.folha.com.br/blog.html